Eu sou a que no mundo anda perdida,

Eu sou a que na vida não tem norte,

Sou a irmã do Sonho, e desta sorte

Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,

E que o destino amargo, triste e forte,

Impele brutalmente para a morte!

Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...

Sou a que chamam triste sem o ser...

Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,

Alguém que veio ao mundo pra me ver,

E que nunca na vida me encontrou!

• Autoria de Florbela Espanca

Tenho saudades de me sentar à janela...

Ouvir o barulho do silêncio...

Observar as estrelas...

Olhar o céu e ficar...

Ali, distante de tudo...

Longe de tudo...

Tenho saudades dos pensamentos...

Que apenas tinha nesses momentos...

Nesses pequenos instantes...

Tenho saudades do som abafado...

Do ar quente...

Das noites de Verão...

Do luar penetrante...

Das estrelas cintilantes...

Tenho saudades de me sentir assim...

Um pouco dentro de mim...

Fora do mundo...

Longe de tudo...

Tenho saudade das lembranças...

Que nessa janela recordava...

Mesmo fazendo uma lágrima rolar...

No meu rosto, saindo dos meus olhos...

Fazia-me bem chorar...

Por apenas lembrar...

Momentos, bons ou maus...

Fazia-me bem, lavar a alma...

Deixar meu espírito levitar...

Se soltar...

Das amarras que o prendiam...

Tenho saudades de soltar meu pensamento....

Como tenho saudades desse tempo...

Como tenho saudades...

Hoje...

Hoje fintei a dor...

E só por um segundo...

Um instante...

Sorri...

Como não me lembrava sorrir...

Olhei o mundo em volta...

Fiquei a olhar...

Por apenas um momento...

Soltei-me das minhas cordas...

Larguei o tempo...

Deixei as amarras...

Que me prendiam...

Flutuei no ar...

Caminhei ao pé das estrelas...

Falei com a Lua...

Abracei o Sol...

Fugi no espaço...

Fugi de mim...

Fugi para a vida...

Fiquei assim um tempo...

Mas...

Num momento...

Num só instante...

A dor voltou...

Jamais me largou...

Sempre esteve aqui...

Dentro de mim...

Consumindo minha alma...

Corroendo meu ser...

Secando minhas lágrimas...

E então chorei baixinho...

Um choro sem lágrimas...

Em silêncio fiquei...

Escostei meu rosto à almofada...

E adormeci...